1ª Edição - Ano MMXXIV
SER na primeira PESSOA
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P. Monteiro
Aluno do 12º ano da E. S. Restelo
O que é a amizade?
A amizade é um conceito muito abstrato, embora, obviamente, tenha uma definição dada pela neurociência que explica todos os químicos cerebrais que são ativados e todas as ligações que acontecem na nossa mente quando fazemos um amigo. Eu, pessoalmente, identifico-me mais com a definição de amizade apresentada por Aristóteles, que nos deixou uma citação que diz que “A amizade é uma alma que habita dois corpos; um coração que habita duas almas”.
Esta citação evoca uma imagem de conexão espiritual entre amigos, uma ligação que transcende os limites físicos e científicos e se manifesta como uma comunhão de almas. Ao descrever a amizade como “uma alma que habita dois corpos”, Aristóteles sugere que os amigos compartilham uma essência fundamental, uma afinidade que os une num nível profundo e transcendental. Essa ideia de uma alma comum ressoa com a noção de que a verdadeira amizade é baseada em afinidades de caráter, valores e experiências compartilhadas.
A segunda parte da citação, que nos diz “um coração que habita duas almas”, destaca a reciprocidade e simetria que a amizade implica, ou seja, para além de uma conexão espiritual, existe um amor mútuo que nutre e sustenta essa ligação de amizade. O coração, símbolo de amor e emoção, é o elo que une as duas almas numa relação de confiança, compaixão e apoio mútuo.
A amizade é, portanto, uma experiência humana universal que se pode rever na afinidade instantânea com alguém ou algo, ou na profunda gratidão de saber que existe alguém com quem podemos partilhar bocadinhos de nós, sem nos perdermos de nós mesmos.
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O que significa a liberdade para si?
A verdadeira liberdade não está necessariamente ligada a circunstâncias externas. É, em vez disso, uma experiência que surge do interior de cada indivíduo. Mesmo em situações de restrição física, como estar na cadeia ou no meio de uma multidão, onde a solidão emocional pode ser sentida, ainda é possível alcançar uma sensação de liberdade verdadeira.
Esta ideia desafia a conceção convencional de liberdade como simplesmente a ausência de restrições externas. Em vez disso, propõe que a liberdade é uma conquista interna, uma capacidade de manter a autonomia e a integridade pessoal, independentemente das circunstâncias externas. Para alcançarmos um estado de liberdade pura, é essencial aprendermos a estar confortáveis connosco, seja em situações de isolamento ou de convívio com outros. Só através da autoaceitação é que nos é possível sermos livres.
A liberdade é uma experiência subjetiva que se cultiva no interior do ser.
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O que trouxe o 25 de abril ao país?
O 25 de abril representa a conquista da democracia e da liberdade como povo. Após quase cinco décadas de regime autoritário sob o Estado Novo, a Revolução do Cravos trouxe o fim da ditadura e o estabelecimento de um regime democrático, onde as liberdades civis e políticas foram restauradas. O povo português foi libertado das restrições impostas pelo regime salazarista, permitindo uma maior participação cívica e o exercício dos direitos fundamentais.
Além disso, o 25 de abril marcou o início de um processo de transformação social e económica em Portugal. As políticas implementadas após a revolução visavam a redução das desigualdades sociais e económicas, promovendo a justiça social e a distribuição mais equitativa da riqueza. Foram tomadas medidas para garantir melhores condições de vida para os trabalhadores, como a implementação de programas de assistência social, o aumento dos salários, a melhoria das condições de trabalho e o acesso universal à saúde e educação.
Esta data proporcionou, também, uma oportunidade para o ressurgimento e fortalecimento dos movimentos sociais e sindicais em Portugal. Organizações de trabalhadores, estudantes, mulheres e outras minorias encontraram espaço para se expressarem e lutarem pelos seus direitos numa sociedade mais aberta e democrática. A liberdade de expressão e de associação permitiu uma maior diversidade de vozes na esfera pública, enriquecendo o debate político e social.
É importante destacar também o processo de descolonização, embora, na minha opinião, tenha sido feito de forma errada. O 25 de abril trouxe, então, o reconhecimento da autodeterminação dos povos colonizados e o fim do domínio colonial português, abrindo caminho para a construção de relações mais igualitárias e solidárias com os países do Sul global. No entanto, penso que este processo devia ter sido mais lento, com o objetivo de darmos tempo à população de cada colónia, especialmente em África, de formarem as suas sociedades e rendimentos, estruturando o seu país de forma a gerar a sua própria riqueza.
A Revolução dos Cravos foi o início de uma mudança. Os valores de Abril ainda não foram todos alcançados e a nossa sociedade ainda tem um longo caminho pela frente. Vivemos agora numa altura de ataque à revolução e a tudo o que foi conquistado depois dela, é, por isso, nosso dever zelar pelos direitos de todos e mudar o rumo que o nosso país tem vindo a tomar. Depois de 50 anos de democracia, o povo já se esqueceu do que era a vida durante a ditadura e eu posso não ter vivido nessa altura, mas leio. Apelo, portanto, aos portugueses que peguem num livro e que “não me obriguem a vir para a rua gritar”.
Em suma, o 25 de abril representa uma rutura no passado autoritário e opressivo e o início de uma nova era de liberdade, justiça social e democracia. Foi um momento de esperança e transformação, onde os valores progressistas foram afirmados e os direitos humanos foram colocados no centro da agenda política nacional.
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Acha que os jovens são compreendidos pelos mais velhos?
A compreensão entre diferentes gerações pode ser um desafio, pois cada uma tem as suas próprias experiências, perspetivas e valores. Os jovens de hoje vivem num mundo em constante mudança, impulsionado pela tecnologia e, consequentemente, pela globalização e outras forças sociais, enquanto os mais velhos têm, muitas vezes, uma visão moldada pelas suas próprias experiências e pela sociedade em que cresceram.
No entanto, é importante reconhecer que as diferenças entre gerações não significam falta de compreensão. Muitos idosos têm um profundo entendimento e empatia pelos desafios enfrentados pelos jovens de hoje, enquanto muitos jovens valorizam a sabedoria e a experiência dos mais velhos.
As lacunas de compreensão podem surgir devido a diferentes pontos de referência culturais, expectativas sociais e formas de comunicação. Por exemplo, os jovens podem sentir-se incompreendidos pelos mais velhos quando estes não entendem as pressões do mundo digital em que vivem, enquanto os mais velhos se podem sentir desconectados das preocupações e valores dos jovens.
Para promover uma maior compreensão entre gerações, é importante cultivar o diálogo aberto e respeito mútuo. A compreensão requer esforço e empatia de ambos os lados e a comunicação eficaz pode ajudar a superar barreiras entre gerações.
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Que mudanças ou melhorias gostarias de ver implementadas no currículo escolar?
Penso que existem vários aspetos que podem ser melhorados ou acrescentados, não tenho é resposta para maneiras de como fazer acontecer.
No entanto, acho que o currículo escolar poderia ser atualizado para incluir uma maior enfâse no desenvolvimento de habilidades como o pensamento crítico, criatividade, colaboração, comunicação e resolução de problemas. Essas habilidades são essenciais para o sucesso num mundo cada vez mais complexo e globalizado.
Apoio também a introdução de componentes de educação socioemocional no currículo, para ajudar os alunos a desenvolver habilidades como a autoconsciência, autogestão, empatia e habilidades de relacionamento. Isso pode contribuir para um ambiente escolar mais positivo, para a erradicação do bullying e para apoiar o bem-estar mental e emocional dos alunos.
Para além disso, penso que a inclusão de educação financeira poderia ajudar os alunos a desenvolverem habilidades de gestão financeira pessoal e a compreender conceitos como orçamento, poupança e investimento e tomar decisões financeiras informadas ao longo da vida.
Penso ainda que deviam ser implementadas mais atividades sobre orientação vocacional. Muitos alunos do secundário enfrentam dificuldades na escolha de uma carreira ou curso superior adequado aos seus interesses e habilidades e, nesse sentido, podiam ainda ser integradas medidas de apoio a estudantes com esse tipo de preocupação.
Por fim, acho que seria benéfico para todos a integração da educação ambiental, para aumentar a conscientização dos alunos sobre questões ambientais globais, como mudanças climáticas, conservação da biodiversidade e sustentabilidade. Isso pode capacitar os estudantes a tomar medidas para proteção do meio ambiente e promover a sustentabilidade nas suas comunidades.
Estas são apenas algumas sugestões de mudanças e melhorias que podem ser implementadas no currículo escolar para tornar a educação mais relevante e preparar os alunos para enfrentarem os desafios do mundo atual e do futuro.
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Quais são os desafios mais significativos que enfrenta enquanto aluno/a do secundário?
O secundário não é uma fase nada fácil. É uma altura em que estamos a iniciar o processo de passagem para a vida adulta e a começar a formar o que será mais tarde a nossa carreira profissional.
Eu pretendo seguir o Ensino Superior e sinto que isso tem tido um grande peso no meu subconsciente, essa pressão académica para obter bons resultados e a importância dos exames nacionais para o ingresso na universidade. Tem sido stressante pensar que o meu percurso escolar realmente importa na maneira como vou viver o meu futuro. E nesse aspeto também sinto que talvez a escola podia ter dado mais apoio. É difícil fazer uma opção destas tão novo e com muito pouca ajuda em termos de orientação vocacional.
Para além disso, também já assisti e fui vítima de situações desagradáveis por parte de colegas, e foram raros os casos em que foram tomadas medidas contra ataques verbais, ou até mesmo físicos. Isso altera o ambiente escolar e dificulta a união e as relações dos estudantes, o que pode acabar por afetar o bem-estar emocional e desempenho académico das vítimas.
Por fim, acho que também não tem sido nada fácil encontrar um equilíbrio entre a vida escolar e a vida pessoal. Para além da escola, eu tenho outros projetos em que estou envolvido que também requerem algum trabalho, responsabilidades familiares, hobbies, interesses pessoais, vida social. Tudo isto tem sido difícil de conciliar com a escola e os estudos.
Acho que são essas as principais dificuldades que tenho carregado durante todo o meu secundário, que aliás me têm causado algum stress e ansiedade.
Qual é o seu maior medo?
O meu maior medo é perder o controlo da minha consciência.
Conheço bem este peso constante nos meus ombros, que provém da consciência de que sou e estou. Tenho medo de perder o controlo dessa consciência e perceber que existiu uma altura antes dos organismos experienciarem a vida na Terra e existirá uma altura depois disso. E, no entanto, eu acordo todos os dias às 06:30 para ir para a escola, esforço-me para sobreviver e, a cada dia que passa, vou crescendo e sinto o meu corpo a envelhecer. Tenho medo de, se perguntar vezes suficientes o porquê de o fazer, deixar de o fazer.
Tenho medo de pensar que era tão mais fácil não estar e não ser.
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Como lida com a ansiedade e a pressão relacionadas com os estudos?
O secundário é uma jornada tumultuosa. Talvez por, na nossa idade, sentirmos as emoções ao rubro e estarmos numa altura de transição de mentalidades, ou talvez por toda a pressão a que somos sujeitos. A verdade é que, em termos escolares, o secundário acaba por ser uma montanha-russa de nervos e stress.
Penso que uma das chaves para lidar com esta ansiedade é o autoconhecimento. É importante reconhecer e compreender as nossas próprias emoções, e identificar gatilhos que desencadeiam esses sentimentos. Só depois é que nos é possível desenvolver estratégias eficazes para lidar com a ansiedade e a pressão relacionadas com os estudos.
A partir daí, existem várias formas de diminuir os níveis de ansiedade. Muitas vezes, a pressão escolar é proveniente da expectativa de que os estudantes atinjam um padrão de excelência irrealista, por isso, eu escolho definir metas alcançáveis que se encaixam no meu leque de habilidades e interesses pessoais, aumentando, assim, a minha motivação para alcançar o sucesso académico e diminuindo a pressão que é colocada sobre mim.
Além disso, tento sempre gerenciar o meu tempo de forma eficaz. Crio planos de estudo estruturados, onde priorizo as minhas tarefas e deveres, e estabeleço intervalos regulares para descanso e lazer. Esta estratégia evita a sobrecarga e a procrastinação e reduz o stress associado aos prazos de entrega de trabalhos e às avaliações.
Por fim, acho que é importante ter a noção de que a escola é só uma pequena parte das nossas vidas e que o nosso valor como indivíduos não é determinado pelas nossas notas ou conquistas académicas. É importante cultivar interesses fora da escola para manter uma vida equilibrada e nutrir relacionamentos significativos, estes são aspetos igualmente importantes para um percurso saudável.
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Quais são os seus objetivos académicos e profissionais para o futuro?
Os meus objetivos académicos e profissionais têm todos um sabor especial a livros e palavras, que espero que me abram caminhos para um mundo de possibilidades.
A próxima etapa da minha jornada académica será, espero eu, na Faculdade de Letras de Lisboa, onde irei, com certeza, encontrar outros amantes da leitura e da escrita e até da arte e da cultura. Pretendo ingressar no curso de Estudos Artísticos e, simultaneamente, tirar as cadeiras optativas do curso de Línguas, Literaturas e Culturas com o objetivo de alcançar um leque mais variado de saídas profissionais, expandindo, assim, os meus horizontes e alimentando a minha paixão pelas Letras. Mais tarde, gostava de tirar um mestrado ou até um doutoramento, mas ainda não pensei muito nisso.
Depois, adorava dedicar a minha vida a algo relacionado com críticas artísticas, literatura, ou ensino universitário dentro das artes e humanidades.
Pretendo desvendar os mistérios da expressão criativa, compartilhar as minhas descobertas e inspirar e ensinar outras mentes como a minha.
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Acha que os jovens são mais felizes hoje do que há 40 ou 50 anos?
A felicidade é um conceito complexo e subjetivo. Embora os jovens de há 40 ou 50 anos possam ter desfrutado de uma vida mais simples e menos pressionada pelas expectativas sociais, é importante reconhecer que a felicidade é influenciada por uma série de fatores contextuais e individuais.
Enquanto os jovens de hoje enfrentam desafios diferentes, como a pressão académica e tecnológica, também têm acesso a oportunidades e avanços que eram inimagináveis no passado.
Afirmar que os jovens do passado eram mais ou menos felizes do que os de hoje é uma simplificação excessiva do significado de felicidade, um conceito multifacetado, moldado por uma variedade de influências e experiências pessoais.
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